Crítica da 1ª temporada de Como um Relâmpago

A surpreendente história por trás do assassinato de James Garfield

Quando falamos sobre presidentes norte-americanos assassinados, a memória coletiva imediatamente resgata nomes como John F. Kennedy e Abraham Lincoln, que ganharam dezenas de documentários, séries, filmes e longas investigações. No entanto, existe um episódio igualmente trágico na história política dos Estados Unidos que raramente recebe a mesma atenção: o assassinato do 20º presidente, James A. Garfield.

A Netflix enxergou nessa lacuna histórica uma oportunidade para transformar um acontecimento pouco explorado em uma minissérie envolvente. Assim nasceu Como um Relâmpago, produção que se propõe a revisitar os momentos que antecederam, cercaram e sucederam o assassinato de Garfield, revelando não apenas a trajetória política do presidente, mas também o desequilíbrio mental e as motivações distorcidas de seu algoz, Charles Guiteau.

Com apenas quatro episódios, cada um com cerca de 45 minutos, a série se compromete a entregar uma narrativa direta, compacta e focada nos eventos principais, sem se perder em tramas secundárias desnecessárias. Isso faz com que a minissérie seja de fácil consumo, ideal para uma maratona rápida de fim de semana, mas também limita a profundidade da história. Como um Relâmpago funciona bem como porta de entrada para quem nunca ouviu falar do caso, mas deixa a sensação de que poderia ter explorado muito mais.

Uma eleição improvável e um destino trágico

A narrativa começa acompanhando o contexto político que levou Garfield, um nome praticamente improvável, a se tornar candidato do Partido Republicano. A produção reconstrói os bastidores da convenção que mudou o rumo da história dos Estados Unidos, mostrando disputas internas, alianças estratégicas e a surpreendente ascensão de um político que não estava no radar das apostas. Essa parte da minissérie é rica em detalhes e apresenta bem a complexidade da política norte-americana da época.

Apesar disso, muitos momentos importantes são apresentados de forma muito objetiva. Não há aprofundamento sobre quem era Garfield antes da presidência, tampouco uma análise realmente profunda das forças políticas que o colocaram naquele posto. A série até menciona suas virtudes, sua integridade e sua luta pessoal, mas não se aprofunda no caráter transformador de suas ideias ou nas tensões internas de um partido dividido em facções poderosas.

A produção toma a decisão de focar mais no essencial: o caminho que leva ao atentado e ao declínio físico e emocional de Garfield, reforçando como sua gestão foi interrompida prematuramente antes mesmo de poder deixar uma marca significativa no país.

O assassino e sua mente fragmentada

Se Garfield é retratado como um homem justo, íntegro, mas cercado por conflitos, Charles Guiteau aparece como o eixo dramático central da minissérie. E isso exige do público uma imersão na mente de um indivíduo instável que acreditava verdadeiramente estar prestando um “serviço patriótico” quando puxou o gatilho.

A série relata brevemente os traumas de infância e os fracassos sucessivos que moldaram o comportamento errático de Charles, mas faz isso de forma muito superficial. Não há uma investigação profunda sobre o desenvolvimento psicológico do assassino, nem uma compreensão plena do que o levou ao fanatismo extremo. O espectador recebe fragmentos de sua história, mas raramente o contexto completo.

Isso torna Guiteau um personagem intrigante, porém incompleto. Ele não é humanizado, tampouco demonizado. Ele é mostrado, acima de tudo, como um homem comum que carrega um senso de grandiosidade desconectado da realidade, reforçando a tragédia de alguém que interpretou o mundo ao seu redor de maneira completamente distorcida.

Conflitos e alianças políticas pouco explorados

Além de Garfield e Guiteau, Como um Relâmpago introduz figuras políticas importantes, como Roscoe Conkling, um dos grandes líderes republicanos da época, e Chester Arthur, vice-presidente que assumiria a presidência após a morte de Garfield.

A série menciona, de passagem, os conflitos históricos entre Roscoe e Chester, suas divergências internas e o impacto disso no cenário político, mas novamente evita mergulhar fundo nesses elementos. É um ponto que merecia mais espaço, já que essas relações são fundamentais para entender o contexto de tensão que marcou o governo Garfield.

O resultado é que parte da trama política parece apressada, quase como uma contextualização breve antes de chegar ao ponto central da minissérie: o atentado. Para produções que desejam unir política, drama e suspense, como A Diplomata (Netflix) ou Designated Survivor (Netflix), o segredo está justamente no aprofundamento dos relacionamentos e da construção de poder. Nesse quesito, Como um Relâmpago entrega menos do que poderia.

Elenco sólido que eleva o material

Se há algo na minissérie que realmente se destaca, são as atuações. Matthew Macfadyen, já conhecido por sua presença marcante em produções como Sucession (HBO Max), interpreta Charles Guiteau com um equilíbrio perfeito entre sutileza e intensidade. Seu trabalho faz com que o personagem nunca caia na caricatura, mantendo o espectador desconfortável e, ao mesmo tempo, intrigado. É uma performance que entrega complexidade emocional mesmo quando o roteiro não aprofunda o suficiente.

Michael Shannon, responsável por dar vida a James Garfield, traz dignidade e força ao personagem. Sua interpretação é contida, mas profundamente expressiva, conseguindo capturar a ambiguidade da vida pessoal do presidente, seus dilemas internos e seu comprometimento com o país. Cada cena com Shannon parece adicionar uma nova camada, mesmo quando a série não se oferece para isso.

Outro destaque é Nick Offerman, que interpreta Chester Arthur com uma combinação única de ironia e presença carismática. Offerman entrega um vice-presidente articulado, envolto em jogos políticos e alianças duvidosas, mas sem perder o toque humano. Sua participação enriquece a minissérie e traz leveza a momentos mais tensos.

Drama acima da política

Embora a proposta inicial de Como um Relâmpago pareça focada no cenário político que levou ao assassinato, a minissérie se inclina muito mais para o drama pessoal do que para as disputas partidárias. O ritmo acelerado e a curta duração fazem com que a série priorize o impacto emocional dos acontecimentos, deixando a análise política em segundo plano.

Isso pode agradar quem busca uma narrativa direta e mais emocional, mas pode frustrar espectadores interessados em produções históricas mais densas, como O Gambito da Rainha (Netflix) ou A Era dos Samurais (Netflix), que valorizam o contexto social e político tanto quanto os personagens.

O ritmo acelerado e a sensação de que falta algo

Com apenas quatro episódios, Como um Relâmpago precisa avançar rapidamente, o que deixa lacunas importantes na narrativa. O resultado é uma série envolvente, mas que parece ter sido feita com pressa, sem a calma necessária para explorar o peso histórico dos eventos retratados.

A história real do assassinato de Garfield é cheia de nuances, intrigas políticas e profundos conflitos internos — elementos que poderiam brilhar em uma minissérie mais extensa ou até mesmo em uma produção cinematográfica mais concentrada. A série entrega o essencial, mas não o completo.

Ainda assim, a narrativa funciona como uma introdução interessante a um episódio pouco conhecido da história norte-americana. Para quem gosta de séries rápidas, baseadas em fatos reais e conduzidas por excelentes atuações, Como um Relâmpago cumpre bem seu papel.

Vale a pena assistir?

Sim — especialmente para quem aprecia dramas históricos, histórias reais e atuações de alto nível. Como um Relâmpago é uma minissérie eficiente e com bom ritmo, ideal para assistir em um único dia. Ela apresenta um acontecimento marcante da história dos EUA e oferece uma visão interessante sobre um dos presidentes mais esquecidos, ao mesmo tempo em que se apoia em interpretações convincentes.

Por outro lado, quem busca aprofundamento político, contexto histórico detalhado ou uma análise mais ampla da época provavelmente sentirá falta de maior desenvolvimento. A série promete muito e entrega parcialmente, deixando no ar a sensação de que poderia ter sido ainda mais completa e impactante.

No fim, Como um Relâmpago é uma produção que ilumina um capítulo pouco discutido da história americana. Ela traz performances memoráveis e um drama bem conduzido, mas também carrega o sentimento de uma oportunidade parcialmente perdida. Ainda assim, é uma boa pedida para quem quer conhecer uma história real surpreendente, marcada por ambições políticas, instabilidade psicológica e consequências que mudaram a trajetória do país.

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