Todos os Crimes da Louva-a-Deus
Todos os Crimes da Louva-a-Deus: um thriller coreano intenso que prende até o fim
Um novo suspense coreano que conquista pela tensão e pela alma trágica
A Coreia do Sul já se consolidou como uma potência mundial quando o assunto é suspense. Produções como Round 6, O Jogo da Morte e O Silêncio (todas disponíveis na Netflix) mostraram o quanto o país domina a arte de contar histórias sombrias com profundidade emocional. Agora, a plataforma apresenta mais uma obra digna de atenção: “Todos os Crimes da Louva-a-Deus”, remake do polêmico original francês A Louva-a-Deus, também da Netflix.
Com apenas oito episódios, a 1ª temporada oferece uma mistura fascinante entre drama psicológico e investigação criminal. A série combina jogos mentais, disfarces engenhosos e um enredo repleto de segredos obscuros. Sob a direção do premiado cineasta Byun Young-joo — conhecido por obras densas como Helpless e Black Out —, o dorama entrega um espetáculo visual e narrativo que flerta com o trágico e o humano.
O elenco, formado por Ko Hyun-jung, Jang Dong-yoon, Cho Seong-ha e Lee El, reforça a força dramática da produção. E é justamente essa combinação de talento, direção precisa e atmosfera sufocante que faz “Todos os Crimes da Louva-a-Deus” se destacar entre os thrillers coreanos disponíveis atualmente na Netflix.
A trama: mãe assassina, filho policial e um imitador misterioso
A história gira em torno de Jung I-shin, também conhecida como Mantis, uma mulher condenada à morte após confessar o assassinato de cinco homens abusivos. Há décadas atrás das grades, ela parece ter desaparecido da memória coletiva — até que um novo assassino surge imitando seus crimes, reproduzindo cada detalhe de suas mortes com perfeição perturbadora.
Quando o caso se torna manchete nacional, a chefe de polícia Choi Jeong-ho recorre à única pessoa capaz de entender a mente do imitador: a própria Mantis. No entanto, há uma condição — ela só aceita cooperar se puder falar com o filho, Cha Su-yeol, um detetive talentoso da Divisão de Crimes de Narcóticos que esconde de todos sua verdadeira origem: ele é o filho da mulher mais temida do país.
O reencontro forçado entre mãe e filho cria uma tensão emocional constante. Su-yeol tenta manter distância da mãe que odeia, enquanto Mantis o manipula sutilmente, revelando fragmentos de um passado doloroso. Ao lado da detetive Kim Na-hee, Su-yeol embarca em uma corrida contra o tempo para capturar o imitador antes que ele faça mais vítimas — mas a cada pista descoberta, novas dúvidas sobre o passado da própria Mantis surgem.
Clima sombrio e suspense psicológico
Desde o primeiro episódio, a série mostra que não pretende ser apenas um drama policial. A direção aposta em um clima sombrio e visual elegante, onde luz e sombra se tornam parte da narrativa. O trabalho de câmera é meticuloso: ângulos fechados, cortes rápidos e uma fotografia fria criam um ambiente que prende o espectador em um constante estado de alerta.
Diferente de produções que apelam para a violência explícita, “Todos os Crimes da Louva-a-Deus” prefere a sutileza e o simbolismo. Os crimes são perturbadores, mas o horror maior vem da psicologia dos personagens, especialmente das manipulações de Mantis e da deterioração emocional de Su-yeol.
Outro destaque é o uso inteligente da música clássica. Em vez de servir apenas como trilha de fundo, a música é incorporada à trama — os assassinos se expressam por meio dela, e as melodias ajudam a compor o perfil psicológico do imitador. Esse recurso estético não apenas intensifica a tensão, mas também funciona como uma ferramenta narrativa sofisticada, elevando o nível da produção.
Uma narrativa cheia de reviravoltas e tensão constante
A escrita do roteiro é precisa ao conduzir o público por uma espiral de suspeitas. Cada episódio termina com um gancho que muda a perspectiva do caso, forçando o espectador a repensar tudo o que acreditava saber. A série brinca com a previsibilidade e cria uma falsa sensação de segurança — apenas para puxar o tapete no momento seguinte.
Essa estrutura evita que o enredo caia em clichês comuns de thrillers policiais. Embora o público seja constantemente induzido a desconfiar de determinados personagens, as respostas nunca são óbvias. É esse jogo entre verdade e engano que mantém a tensão viva até os minutos finais.
Além disso, o roteiro oferece momentos de introspecção emocional, explorando o quanto trauma, culpa e amor podem se misturar. A relação entre mãe e filho é o verdadeiro coração da narrativa, e é nesse ponto que o dorama se diferencia da versão francesa: há uma sensibilidade mais profunda, um olhar mais humano sobre o sofrimento e a busca por redenção.
O peso das atuações: Ko Hyun-jung e Jang Dong-yoon brilham
Nenhum thriller funciona sem atuações fortes — e neste quesito, “Todos os Crimes da Louva-a-Deus” acerta em cheio.
Ko Hyun-jung entrega uma performance magnética como Mantis. Sua personagem é uma mistura de frieza e vulnerabilidade. Ela sorri nos momentos mais inapropriados, manipula com sutileza e, ao mesmo tempo, carrega uma tristeza silenciosa. É impossível não se sentir atraído por sua presença, mesmo sabendo o que ela é capaz de fazer. Hyun-jung transforma Mantis em uma figura quase mítica: assustadora, mas também trágica.
Por outro lado, Jang Dong-yoon tem o desafio de interpretar Su-yeol, um policial honesto que carrega a vergonha de ser filho de uma assassina. Ele equilibra perfeitamente o conflito interno do personagem — dividido entre o dever e a emoção, entre o ódio e a saudade. Há momentos em que Dong-yoon faz o espectador duvidar: será que ele é tão diferente da mãe quanto acredita?
A química entre os dois é intensa. As cenas em que mãe e filho se encaram são carregadas de dor, raiva e empatia. Essa dualidade torna suas interações imprevisíveis e fascinantes, sustentando boa parte da força dramática da série.
Elenco de apoio e camadas narrativas
O elenco coadjuvante também merece destaque. Lee Tae-gu, Lee Chang-min e Han Dong-hee entregam atuações consistentes, cada um interpretando personagens com segredos e motivações próprias. Eles ajudam a criar um universo policial verossímil e cheio de tensões.
Contudo, Han Dong-hee acaba tropeçando no penúltimo episódio, quando sua personagem ganha uma reviravolta forçada. Em uma tentativa de imitar a intensidade de Ko Hyun-jung, a atriz exagera e perde a naturalidade. A sequência soa artificial e destoa do restante da narrativa, especialmente por tentar abordar temas delicados da versão francesa de forma apressada e superficial.
Ainda assim, esses deslizes não comprometem a experiência como um todo. Os personagens secundários têm arcos próprios, exploram conflitos no ambiente de trabalho e reforçam a complexidade moral da trama. Os embates entre Cho Seong-ha e Lee El, por exemplo, acrescentam um subtexto interessante sobre política interna e hierarquia policial.
O simbolismo por trás do título
Assim como o inseto que dá nome à série, Mantis é uma figura que une beleza e letalidade. A metáfora da louva-a-deus — uma criatura que devora o parceiro após o acasalamento — simboliza a natureza destrutiva do amor materno de I-shin. Ela ama o filho, mas seu amor é sufocante, possessivo e mortal.
A direção utiliza esse simbolismo de forma visual e emocional: cenas em que a personagem aparece cercada por sombras, ou momentos em que suas mãos lembram as patas do inseto, reforçam a conexão entre a mulher e a criatura. É uma escolha artística que transforma a série em algo mais do que um simples drama policial: é um estudo sobre o instinto e a monstruosidade humana.
Diferenças entre o remake coreano e o original francês
Enquanto o original francês A Louva-a-Deus (2017) era mais direto e provocativo, o remake coreano busca um equilíbrio entre fidelidade e reinvenção. Byun Young-joo suaviza alguns dos elementos mais controversos da obra original, mas acrescenta profundidade emocional e um tom poético que se alinha com a tradição dos doramas.
Alguns diálogos soam um pouco forçados, especialmente nas tentativas de justificar mudanças de roteiro, mas no geral a adaptação funciona bem. A produção coreana respeita a essência da história e, ao mesmo tempo, cria uma identidade própria, com foco nas emoções e nos traumas familiares.
Um final impactante, mas imperfeito
O último episódio tenta amarrar todas as pontas, mas acaba escorregando em alguns momentos de exagero. Certas revelações soam apressadas, e a série parece hesitar entre seguir o desfecho trágico do original ou oferecer algo mais conciliador. Ainda assim, o clímax é emocionalmente poderoso e faz jus ao vínculo construído entre mãe e filho.
Mesmo tropeçando na reta final, “Todos os Crimes da Louva-a-Deus” não deixa de ser uma experiência intensa e envolvente. O equilíbrio entre drama familiar, mistério e suspense psicológico mantém o público preso até o último minuto.
Conclusão: um thriller imperfeito, mas fascinante
“Todos os Crimes da Louva-a-Deus” é mais do que uma história sobre crimes e imitações — é uma jornada emocional sobre culpa, amor e monstros que criamos dentro de nós. Mesmo com pequenos deslizes de roteiro e atuações que oscilam em certos pontos, a série mantém uma qualidade técnica e artística impressionante.
Com direção sofisticada, atuações marcantes e uma trilha sonora memorável, o dorama reafirma o talento da Coreia do Sul para criar narrativas complexas e visualmente arrebatadoras.
Se você é fã de suspenses como Revenant, O Silêncio e Flower of Evil, também disponíveis na Netflix, “Todos os Crimes da Louva-a-Deus” é uma escolha obrigatória — não apenas pela tensão, mas pela emoção genuína que ela desperta.
Nota final
Apesar de não atingir a perfeição, a série cumpre seu propósito: assustar, emocionar e fazer pensar. É um thriller de alma trágica, que transforma o amor materno em algo tão belo quanto perigoso. E, no fim das contas, é isso que torna “Todos os Crimes da Louva-a-Deus” inesquecível.
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