O Abismo Mágico
O Abismo Mágico – Crítica da 1ª temporada da série coreana da Netflix
Uma série entre o romance e o mistério
A Netflix vem investindo pesado em produções coreanas, e O Abismo Mágico é mais uma dessas apostas que buscam combinar elementos de diferentes gêneros para conquistar o público. Dividida em 16 episódios, a série mistura comédia romântica e suspense policial, tentando equilibrar o humor leve com uma trama sombria de investigação. O resultado, no entanto, é uma obra que oscila entre acertos e tropeços, com uma identidade que se perde em meio a tantas ideias.
Essa mistura de estilos faz com que O Abismo Mágico pareça duas séries diferentes convivendo dentro da mesma história. De um lado, há um romance envolvente, sustentado pela ótima química entre os protagonistas Se-Yeon e Cha Min. De outro, um suspense policial repleto de clichês e decisões narrativas confusas. Embora existam bons momentos, o enredo irregular e o ritmo desequilibrado tornam a experiência mais cansativa do que empolgante.
A trama: um orbe misterioso e vidas recomeçadas
A história começa com um toque fantástico que chama a atenção. Um objeto misterioso conhecido como o “Abismo” tem o poder de trazer pessoas de volta à vida, mas com uma nova aparência — um conceito promissor e cheio de possibilidades. Cha Min, um homem inseguro e de aparência comum, acaba morrendo de forma trágica, mas é ressuscitado pelo poder do orbe. Ao retornar, ele descobre que ganhou um novo rosto, muito mais bonito do que antes.
Pouco tempo depois, sua amiga e grande amor não declarado, Se-Yeon, é assassinada. Desesperado, Cha Min decide usar o Abismo para trazê-la de volta — e, assim como ele, ela renasce com um novo rosto. Esse ponto de partida abre espaço para reflexões sobre identidade, aparência e segundas chances, mas a série não se aprofunda tanto quanto poderia nesses temas.
A partir desse evento, a trama se divide em dois caminhos: o primeiro, focado na relação entre os protagonistas e na forma como eles redescobrem um ao outro sob novas aparências; o segundo, centrado em uma investigação criminal que tenta conectar o poder do Abismo com uma série de assassinatos misteriosos. É justamente nessa divisão que a narrativa começa a se fragmentar.
Quando duas histórias colidem
A primeira metade de O Abismo Mágico aposta no romance e na comédia leve. A interação entre Cha Min e Se-Yeon é divertida, com momentos genuinamente doces e diálogos que exploram bem a estranheza de recomeçar a vida em corpos diferentes. Essa parte é leve, envolvente e tem o carisma necessário para prender o espectador.
No entanto, à medida que os episódios avançam, a série começa a dar mais espaço para o suspense policial, e é aí que os problemas surgem. O vilão principal, Oh Young, e o arco envolvendo seu filho são genéricos, cheios de reviravoltas previsíveis. O Abismo, que deveria ser o elemento central da história, passa a ser usado apenas quando conveniente para o roteiro, como um artifício para resolver situações impossíveis ou criar novos conflitos.
Essa inconsistência enfraquece a trama, que perde o foco e se torna uma colcha de retalhos de ideias boas, mas mal desenvolvidas. O tom também muda bruscamente: o que antes era um romance leve e divertido passa a se alternar com cenas sombrias e violentas, quebrando o ritmo da narrativa e afastando parte do público que esperava uma história mais coesa.
A força do casal principal
Mesmo com todos os tropeços do roteiro, O Abismo Mágico encontra sua maior qualidade na relação entre Se-Yeon e Cha Min. A química entre os protagonistas é inegável, e o romance entre eles é o fio condutor que mantém a série de pé até o final. Há sinceridade nas interações e um cuidado na forma como o amor é retratado, especialmente quando ambos precisam lidar com as mudanças físicas e emocionais provocadas pelo Abismo.
Esse contraste entre aparência e essência é um dos temas mais interessantes da série, ainda que seja explorado de maneira superficial. A mensagem de que o verdadeiro valor das pessoas vai além da beleza exterior é clara, mas acaba diluída em meio às subtramas policiais que não acrescentam muito à história principal.
O problema da identidade e o excesso de ideias
Talvez o maior defeito de O Abismo Mágico seja sua indecisão sobre o que quer ser. A série tenta abraçar tantos gêneros — fantasia, romance, comédia, drama e suspense — que acaba não se destacando em nenhum deles. A mistura poderia funcionar se houvesse equilíbrio, mas o que se vê é um produto confuso, que constantemente abandona suas melhores ideias para seguir rumos previsíveis.
O Abismo, que deveria ser o elemento mais fascinante da trama, perde relevância rapidamente. Suas regras mudam conforme a conveniência dos roteiristas, e o orbe aparece e desaparece de forma aleatória, tornando difícil entender sua lógica. Esse tipo de inconsistência narrativa prejudica a imersão e gera frustração em quem esperava uma mitologia mais sólida.
Estilo visual e escolhas estéticas
Visualmente, a série é agradável, mas peca pelo excesso de product placement. Assim como outras produções coreanas da Netflix, O Abismo Mágico abusa da presença da rede Subway, com cenas claramente criadas para destacar as cores verde e amarela da marca. Esse tipo de inserção, quando feita de forma exagerada, tira o espectador da história e prejudica a imersão.
No entanto, a fotografia e o design de produção conseguem criar uma atmosfera interessante, especialmente nas cenas que exploram o contraste entre o mundo “real” e o elemento sobrenatural do Abismo. As sequências oníricas, os flashbacks e os monólogos internos ajudam a compor o tom melodramático que tanto agrada aos fãs de doramas.
Ritmo irregular e episódios longos
Com 16 episódios que ultrapassam a marca dos 60 minutos cada, O Abismo Mágico exige paciência do público. O ritmo é irregular, alternando momentos de grande emoção com trechos arrastados e repetitivos. Em vários episódios, a sensação é de que a série poderia ter sido mais curta e focada, o que teria beneficiado tanto o desenvolvimento dos personagens quanto a fluidez da narrativa.
Ainda assim, há quem aprecie esse formato mais prolongado, típico das produções coreanas. Os fãs do gênero encontrarão aqui os elementos clássicos que já esperam: o humor leve, o melodrama romântico e a constante tensão entre o destino e as escolhas individuais.
Comparações com outras produções coreanas
Dentro do catálogo da Netflix, O Abismo Mágico lembra outra produção que também explora a mistura de gêneros, como A Lição. No entanto, ao contrário dessas séries, que mantêm um foco bem definido, O Abismo Mágico se perde na tentativa de agradar a públicos diferentes. Enquanto A Lição aposta na vingança e no suspense psicológico, e Apostando Alto foca no empreendedorismo e na superação, O Abismo Mágico não consegue escolher qual caminho seguir.
Isso não significa que seja uma experiência totalmente negativa. Há algo encantador no romance entre os protagonistas, e algumas reviravoltas conseguem surpreender. Mas, quando o último episódio termina, a sensação que fica é a de que o potencial do enredo foi desperdiçado.
Vale a pena assistir O Abismo Mágico?
Se você é fã de doramas e gosta de histórias de amor com um toque de fantasia, O Abismo Mágico pode ser uma opção interessante — principalmente pelo casal central, que conquista o público com sua naturalidade e ternura. No entanto, se a sua expectativa é acompanhar um suspense envolvente ou uma narrativa com mitologia consistente, talvez a série decepcione.
A proposta era promissora: um orbe capaz de dar novas vidas, explorando as consequências emocionais e morais disso. Mas o roteiro se perde em tramas paralelas e personagens secundários pouco carismáticos, deixando de lado o que realmente importava: o vínculo humano e emocional entre os protagonistas.
Conclusão: um potencial desperdiçado
O Abismo Mágico é o típico caso de uma boa ideia mal executada. A série tinha todos os elementos para ser um sucesso — elenco carismático, conceito original e produção de alto nível —, mas tropeça na tentativa de equilibrar romance e mistério. O resultado é uma história com bons momentos, mas que não se sustenta até o fim.
A química entre Se-Yeon e Cha Min é o que impede a série de ser um desastre completo. Sem eles, a trama perderia completamente o sentido. No entanto, a falta de foco e o excesso de clichês tornam O Abismo Mágico uma experiência irregular, que dificilmente ficará na memória dos fãs de dramas coreanos.
Se a série tivesse optado por seguir o caminho do romance sobrenatural e deixado o suspense policial de lado, provavelmente estaríamos falando de uma produção muito mais coesa e envolvente. Ainda assim, para quem busca um dorama leve e curioso, vale dar uma chance — com as expectativas ajustadas.
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